Direito dos animais: o que é e qual a legislação no Brasil
Você já ouviu falar no Direito dos animais? Embora seja uma área pouco estudada, ela vem ganhando notoriedade nos últimos anos. Trata-se de um nicho que enfrenta diversas barreiras, mas que é essencial para a proteção de seres vivos não humanos.
Com o avanço dos anos, os animais passaram a ser vistos como seres que merecem direitos. Por isso, diversas nações já possuem legislações que abordam o tema.
Aproveite esse tempo para ler sobre o Direito dos animais e entender o que tem de interessante nesse ramo jurídico!
O que é o Direito dos animais?
O Direito animal pode ser classificado como o conjunto de regras e princípios que determinam os direitos dos animais não humanos, independentemente da sua função ecológica, científica ou econômica.
Isso significa que o objetivo é dar direitos e proteção a esses seres vivos, entendendo-os como sujeitos de direitos. Trata-se de um ramo que, embora pouco conhecido, vem evoluindo e ganhando notoriedade.
Como surgiu o Direito dos animais?
O ponto de partida simbólico para o surgimento do Direito dos Animais ocorreu em 1978, quando a UNESCO proclamou a Declaração Universal dos Direitos dos Animais. Nela, reconhece-se que todo animal tem direito à atenção, respeito, cuidados e à proteção do homem. Além disso, defende que nenhum animal deve ser submetido a atos cruéis.
Embora essa declaração não tenha força normativa, ela se tornou uma importante referência para defensores da causa animal e influenciou legislações em vários países.
A relação entre seres humanos e seres não humanos acontece há milhares de anos. Desde sempre, o homem buscou estabelecer uma relação de dominação com as outras espécies de seres vivos. Inclusive, passou a separá-los conforme os seus interesses, classificando-os em diferentes categorias como: alimentação, trabalho, transporte, domesticação, dentre outras.
Nesse contexto, esses seres vivos foram historicamente explorados e utilizados para os mais diversos fins pessoais e econômicos, como: alimentação, vestimenta, agricultura, diversão (em circos, por exemplo), mercado de pets, dentre outros. Antigamente, sequer eram considerados seres vivos com direitos; muitos os tratavam como bens, incapazes de sentir dor ou ter sentimentos.
Felizmente, com o passar do tempo, os seres humanos passaram a refletir melhor sobre o seu papel no planeta Terra. Assim, temas relacionados à proteção dos animais ganharam força, impulsionados por movimentos sociais em prol do meio ambiente e por organizações não governamentais (ONGs) dedicadas ao tema.
Com isso, a legislação referente aos animais evoluiu significativamente. Embora alguns especialistas considerem o Direito Animal um ramo autônomo, outros o entendem como uma subdivisão do Direito Ambiental.
Diversas nações passaram a criar leis específicas para proteger os animais, e, em alguns países, eles já são reconhecidos como sujeitos de direitos, assim como os humanos. Em outros, sua proteção ainda está vinculada à legislação ambiental.
O que a Declaração Universal dos Direitos dos Animais defende?
A Declaração Universal dos Direitos dos Animais, criada em 1977 e proclamada 1 ano depois pela UNESCO, contém 14 artigos que defendem que os animais possuem direitos a uma vida digna. Dessa forma, é papel dos seres humanos protegê-los e cuidá-los, principalmente daqueles que convivem em seus ambientes domésticos.
Entre os artigos do documento, é possível encontrar o direito à igualdade entre os seres vivos e o de viver em condições próprias da espécie.
Confira agora os dez princípios dos direitos dos animais, de acordo com a declaração:
- Todos os animais têm o mesmo direito à vida;
- Todos os animais têm direito ao respeito e à proteção dos humanos;
- Nenhum animal deve ser maltratado;
- Todos os animais selvagens têm o direito de viver livremente no habitat;
- O animal que o humano escolher para companheiro nunca deve ser abandonado;
- Nenhum animal deve ser usado em experiências que causem dor;
- Todo ato que põe em risco a vida de um animal é um crime contra a vida;
- A poluição e a destruição do meio ambiente são considerados crimes contra os animais;
- Os direitos dos animais devem ser defendidos por lei;
- Os humanos devem ser educados para observar, respeitar e compreender os animais desde a infância.
Aos que desejam se especializar nessa área, aconselha-se a leitura na íntegra da declaração.
Quais são os direitos fundamentais dos animais?
Os direitos dos animais acabam sendo selecionados de acordo com a espécie do ser vivo em questão. Por exemplo, cetáceos, como baleias e golfinhos, têm o direito à vida e à liberdade garantida por lei.
Animais de estimação, principalmente cães e gatos, possuem diversos direitos devido a sua proximidade e dependência dos seres humanos. Alguns deles são: direito à vida, à moradia, a cuidados veterinários, de não sofrerem maus-tratos, dentre outros.
Em relação aos animais silvestres, estes possuem direito à vida e à liberdade na natureza. Contudo, se existir necessidade científica, tais direitos podem ser restringidos. Ademais, espécies ameaçadas de extinção podem ser mantidas em cativeiro para a sua reprodução.
Os animais que são submetidos às atividades de pesca, pecuária e científica acabam sendo os mais vulneráveis. Embora tenham direito à dignidade e respeito, não possuem direito pleno à vida, visto que são utilizados para alimentação e outras atividades econômicas.
Em relação a este último grupo de animais, é essencial que sejam cumpridas as regras que vedam a crueldade e defendem a dignidade animal. Na prática, essas regras não são respeitadas em muitos ambientes como abatedouros e empresas produtoras de carne.
Inclusive, o direito à vida desses animais é debatido por diversos especialistas no tema. Tanto que se discute a possibilidade de substituir a morte deles por carnes produzidas em laboratórios, por meio das células desses seres. Essa é a promessa de muitas empresas, principalmente da área da tecnologia.
Como é a legislação de Direito dos animais no Brasil?
No Brasil, a primeira legislação a tratar do tema foi o Decreto 16.590 de 1924. O objetivo foi regulamentar as atividades públicas que utilizavam animais, como: rinhas de galos, corridas de touro, brigas de cachorros, dentre outras que causam sofrimento a esses seres.
Posteriormente, foi criado o Decreto 24.645 de 1934. Essa legislação estabeleceu diversos tipos de maus tratos, os quais foram disciplinados na Lei das Contravenções Penais. Esta última, criada em 1941, define penas para quem tratar animais com crueldade ou submetê-los ao trabalho excessivo. Essa disposição se encontra no artigo 64. Confira:
Art. 64. Tratar animal com crueldade ou submetê-lo a trabalho excessivo:
Pena – prisão simples, de dez dias a um mês, ou multa, de cem a quinhentos mil réis.
§ 1º Na mesma pena incorre aquele que, embora para fins didáticos ou científicos, realiza em lugar público ou exposto ao público, experiência dolorosa ou cruel em animal vivo.
§ 2º Aplica-se a pena com aumento de metade, se o animal é submetido a trabalho excessivo ou tratado com crueldade, em exibição ou espetáculo público.
É preciso citar também o artigo 225 da Constituição Federal de 1988, o qual defende que a proteção do meio ambiente é essencial para uma melhor qualidade de vida. Ademais, o dispositivo determina que a fauna precisa ser preservada, vedando práticas que causem a extinção de espécies ou submetam animais à crueldade.
A Lei dos Crimes Ambientais trouxe certa evolução aos Direitos dos animais. No artigo 32, está tipificado o crime de maus-tratos aos animais. Confira:
Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste artigo será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.
Em 2020, foi sancionada a Lei 14.064, conhecida como Lei Sansão. Ela aumentou a pena para os crimes de maus-tratos quando se tratar de cão ou gato. Embora alguns entendam que se trata de um avanço, ela exclui outros tipos de animais que também são domésticos, como: coelhos, porquinhos da Índia, dentre outros.
Por fim, diversas cidades brasileiras vêm aprovando legislações próprias para tratar da proteção dos animais, sejam eles domésticos ou para trabalho.
Outras legislações interessantes de serem comentadas são:
- Decreto 221 de 1967 (Código da Pesca);
- Lei 5.197 de 1967 (Lei de Proteção à Fauna);
- Lei 6.638 de 1979 (Lei da Vivissecção);
- Lei 7.173 de 1983 (estabelece diretrizes para o funcionamento de zoológicos).
Quais as principais políticas públicas para a proteção dos animais no Brasil?
No Brasil, a proteção dos animais é assegurada por um conjunto de políticas públicas, leis e programas, voltados ao bem-estar e à saúde animal, além da prevenção de maus-tratos. Abaixo estão algumas das principais iniciativas:

Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998)
Esta lei criminaliza os maus-tratos contra animais, prevendo penas que variam de detenção a multa para quem praticar atos de abuso, ferimento ou mutilação de animais silvestres, domésticos ou domesticados. A lei é uma das bases legais mais importantes na defesa dos direitos dos animais no país.
Lei de Proteção aos Animais (Lei nº 14.064/2020)
Conhecida por aumentar a pena para maus-tratos a cães e gatos, essa lei alterou o artigo 32 da Lei de Crimes Ambientais, estipulando reclusão de 2 a 5 anos, multa e proibição da guarda para quem maltratar esses animais. É uma resposta direta à crescente preocupação com o bem-estar dos animais de estimação.
Programas de castração e vacinação
Muitos municípios e estados implementam programas gratuitos ou subsidiados de castração e vacinação de cães e gatos. Essas ações controlam a população animal, previnem doenças e contribuem para a saúde pública e o bem-estar animal.
Criação de conselhos municipais de proteção animal
Diversas cidades instituíram Conselhos Municipais de Proteção e Bem-Estar Animal, que reúnem representantes do poder público, ONGs e sociedade civil para discutir e planejar políticas públicas voltadas aos animais.
Criação de abrigos e centros de zoonoses
Os centros de controle de zoonoses (CCZs) têm papel importante na saúde pública, atuando no controle de doenças transmissíveis entre animais e humanos. Já os abrigos públicos e parcerias com ONGs oferecem assistência a animais em situação de rua ou vítimas de maus-tratos.
Qual é a importância do Direito dos animais no Brasil?
O Direito animal é fundamental para garantir o respeito e a dignidade desses seres, evitando violações e sofrimento a eles.
Por muitos anos, os animais não humanos foram vistos apenas como bens, seres desprovidos de sentimentos, direitos e autonomia. Na prática, são utilizados para satisfazer os desejos das pessoas, seja de forma pessoal ou econômica.
Em relação aos animais domésticos, por estarem em condições desiguais com os seus tutores, é fundamental garantir que sejam respeitados e tratados de forma digna.
Os animais domésticos estão sujeitos a maus tratos e outras formas de tratamento cruéis. Além disso, as espécies utilizadas para outros fins, como trabalho e alimentação, também precisam de proteção para não serem submetidas a tratamentos cruéis.
Contudo, a legislação sobre o tema, inclusive no Brasil, precisa evoluir. Isso porque, de certa forma, o Direito dos Animais acaba sendo ligado apenas à proteção do meio ambiente e de animais domésticos, mais especificamente cães e gatos.
Inclusive, essa é uma grande crítica por parte de muitos defensores dos animais: a lei acaba sendo seletiva, determinando quais animais precisam de proteção e quais não. Dessa forma, muitas espécies continuam sendo exploradas e tratadas de forma degradante, principalmente as destinadas para a alimentação, vestuário e outras atividades econômicas.
Quais os desafios do Direito dos animais no Brasil?
O Direito dos Animais no Brasil enfrenta diversos desafios que dificultam a plena efetivação da proteção e do bem-estar animal. A seguir, estão os principais obstáculos enfrentados nesse campo:
- Lacunas Legislativas e Interpretações: apesar de avanços, o Brasil ainda carece de uma legislação mais abrangente e específica sobre os direitos dos animais;
- Fiscalização e Penalidades: a fiscalização é limitada, principalmente em áreas rurais e periferias urbanas. Faltam profissionais capacitados, estrutura e apoio técnico;
- Conscientização da Sociedade: ainda há um longo caminho na educação e conscientização da população sobre o bem-estar animal, guarda responsável e o reconhecimento dos animais como seres sencientes;
- Recursos Financeiros: as políticas públicas voltadas à causa animal enfrentam escassez de recursos. ONGs, protetores independentes e até órgãos públicos lutam com falta de financiamento para manter abrigos, realizar resgates, castrações e atendimentos veterinários;
- Exploração Econômica: setores como o agronegócio, o entretenimento (rodeios, vaquejadas, circos), e a indústria de cosméticos enfrentam conflitos diretos com o Direito dos Animais, pois frequentemente envolvem exploração ou sofrimento animal, dificultando o avanço de leis mais protetivas;
- Definição jurídica do animal: embora existam avanços no reconhecimento dos animais como seres sencientes, ainda predominam normas que os tratam como bens móveis (Código Civil).
Como outros países tratam os direitos dos animais?
O Direito animal também tem previsão no ordenamento jurídico de diversos países ao redor do mundo. Veja abaixo como esse tema é tratado em algumas nações!
Alemanha
Na legislação alemã, existe previsão determinando que todos os seres vivos devem ser respeitados. Logo, tanto animais quanto humanos merecem um tratamento decente.
Dessa forma, o Estado deve proteger a vida animal pautando-se pelos fundamentos naturais da vida. Ao implementarem a lei de bem-estar animal, a nação passou a fornecer clínicas veterinárias e centros de atendimento a animais de estimação em todo o país. Existem também limites para o uso de animais em testes, como os de cosméticos e medicamentos.
Áustria
Em 2005, o tema do bem-estar animal se tornou uma questão federal nesse país. Sendo assim, a legislação é ampla e protege, por exemplo, animais de fazenda, aves domésticas, peixes de fazenda, dentre outros. Ademais, traz requisitos que devem ser verificados para a criação e manutenção desses bichos.
É dever do governo federal promover o bem-estar dos animais e buscar meios de condenar os agressores desses seres. Da mesma maneira, a lei proíbe a posse de animais selvagens.
Portugal
Sobre Portugal, este país possui uma lei muito interessante. Embora animais sejam ainda bens semoventes, sujeitos a serem propriedade de humanos, eles já são considerados seres vivos sensíveis e autônomos para o Estado português.
Dessa maneira, o tutor de um animal de estimação deve garantir o seu bem-estar, podendo ser punido se praticar qualquer tipo de abuso.
Em caso de separação ou divórcio, o animal de estimação do casal deve se submeter às decisões sobre guarda e visita, da mesma forma que ocorre com os filhos menores.
Vale mencionar que, no Brasil, já houve decisões definindo sobre a guarda e visita de um animal de estimação em casos de casais que se divorciaram.
Austrália
De acordo com a legislação australiana, os animais têm sentimentos. Uma pessoa que maltrata animais de estimação pode ser condenada à prisão e até, a pagar uma multa, que varia de acordo com o nível da crueldade do ato.
Além disso, existe previsão autorizando que terceiros entrem em propriedades de estranhos se perceberem que existe um animal sendo maltratado ou em cárcere privado. Por fim, a legislação local determina que se uma pessoa encontrar um animal ferido na estrada, deve levá-lo a um veterinário, independente de ser o causador ou não do acidente.
Conclusão
O Direito dos Animais representa muito mais do que uma tendência: é uma resposta jurídica e ética à evolução da consciência humana em relação aos demais seres vivos.
Cada vez mais presente em debates acadêmicos, sociais e jurídicos, esse ramo do Direito atrai profissionais que desejam atuar com propósito, alinhando sua prática à proteção ambiental e à dignidade animal. Para quem se identifica com essa causa, há um campo de atuação promissor.
Com o aumento da preocupação pública com o bem-estar animal, surgem novas oportunidades em áreas como consultoria, advocacia preventiva, atuação junto a ONGs, denúncias de maus-tratos, entre outras frentes. No entanto, é fundamental estudar a fundo a legislação vigente, acompanhar as atualizações e entender como se posicionar de forma estratégica no mercado.
Se você se interessa por esse tema e deseja construir uma carreira engajada, o primeiro passo é investir em conhecimento e se organizar desde o início.
Experimente gratuitamente o ADVBOX e veja como a plataforma pode otimizar sua rotina, automatizar tarefas e facilitar a gestão do seu escritório jurídico, inclusive se você pretende atuar com causas ambientais e do Direito dos Animais.
