A repetição de indébito ocorre quando é preciso realizar a devolução de qualquer quantia cobrada de alguém de forma errônea e descabida.
É um instituto presente no ramo jurídico com aplicação nas áreas do Direito Civil, do Direito do Consumidor e do Direito Tributário para resolução de conflitos advindos dessas cobranças indevidas.
Quer entender mais sobre o cabimento e peculiaridades da repetição de indébito? Continue lendo o artigo!
Quando cabe repetição de indébito?
A repetição de indébito, de modo geral, é cabível quando um individuo é cobrado por algo que já pagou, indevidamente ou com valor excedente, tendo direito a obtenção de uma reparação logo após perceber esse erro, através do ingresso dessa ação judicial.
Um exemplo claro da repetição de indébito é quando um cliente compra um celular no comércio eletrônico por R$ 3500,00, porém são cobrados R$ 3800,00 em seu cartão de crédito, assim ele teria direito à repetição de indébito pelo valor excedente de R$ 300,00, sendo este um caso do Direito do Consumidor.
Apesar do exemplo consumerista sobre este assunto ser muito comum, cabe dizer que a repetição de indébito também se encontra nas áreas do Direito Civil e do Direito Tributário.
Essa ação de repetição de indébito se apoia, especialmente, no Código Civil de 2002. Veja o artigo 876 deste dispositivo legal!
Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.
Vale salientar que, não ocorrendo a devolução, o credor que obteve esses valores erroneamente, incorre no ilícito de enriquecimento sem causa, conforme os artigos 884 e 885 do CC, expostos a seguir.
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.
Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.
O que é repetição de indébito no CC?
A repetição de indébito no Código Civil é uma medida processual pela qual a pessoa pode requerer a devolução da quantia que pagou sem necessidade.
O fundamento da ação de repetição do indébito, neste dispositivo legal, traz o enriquecimento sem causa, também chamado de enriquecimento ilícito, como o ponto principal a ser considerado no caso concreto.
Ainda, será devida a restituição no caso do objeto da dívida deixar de existir, como quando há um negócio de compra e venda de um veículo, porém o mesmo é furtado antes de ser entregue, dessa forma deixando de existir, logo a causa do enriquecimento do credor também deixou.
No âmbito civilista, a ação de repetição de indébito é vista como uma ação de indenização ou de responsabilidade civil, se enquadrando nos artigos 927, 186 e 187 do Código Civil, que tratam da obrigação de indenizar, conforme exposto abaixo, respectivamente:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
O intuito da responsabilização civil é reparar qualquer dano que possa reduzir o bem jurídico da vítima, sendo este bem jurídico o dinheiro, assim aquele credor que der causa a um prejuízo pecuniário ao devedor, por realizar uma cobrança a mais ou por cobrar algo que ele já pagou, fica com o ônus de indenizá-lo.
A propositura da ação de repetição de indébito pode ocorrer na Justiça Comum e nos Juizados Especiais Cíveis, desde que o valor da causa não exceda 40 salários mínimos.
No que se refere a prescrição, cabe dizer que prescreve em três anos a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa, nos termos do artigo 206, § 3o, inciso IV, do CC.
O que é repetição de indébito no CDC?
A repetição indébito no Código de Defesa do Consumidor ocorre quando é necessário proceder com a devolução em dobro de uma quantia paga indevidamente pelo consumidor.
Nas relações de consumo a entidade empresarial que deverá proceder à devolução em dobro do consumidor pela quantia excedente que lhe foi cobrada, além dos juros e da correção monetária.
É necessário distinguir duas espécies de consumidores:
- Consumidor adimplente: aquele que arca com os créditos contraídos, estando com o pagamento de suas contas em dia;
- Consumidor inadimplente: aquele que deixa de pagar algo, devendo dinheiro.
No que se refere ao consumidor inadimplente, o CDC traz a possibilidade de inscrição em bancos de dados de consumidores, como o SPC e o Serasa, porém também prevê garantias a essas pessoas, como a necessidade de comunicação dessa inscrição e a obrigação de corrigir informações a partir da comunicação ao órgão responsável.
Apesar disso, tanto o consumidor adimplente quanto o inadimplente, jamais poderão ser tratados de forma humilhante, independentemente da situação em que estejam, conforme previsão legal no caput do artigo 42 do CDC.
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Já no parágrafo único deste mesmo artigo, está exposto claramente o fato de que o consumidor cobrado indevidamente, deverá ser restituído em dobro em relação ao que pagou a mais, acrescido de juros e correção monetária. Confira!
Art. 42. (…)
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Assim observamos que a fundamentação presente no CDC é a mesma da exposta no artigo 940 do Código Civil, veja!
Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.
Desta forma, podemos afirmar que o âmbito do Direito do Consumidor também previu que a devolução seja efetuada em dobro, nas situações em que o consumidor seja demandado por valor já pago, assim como no Direito Civil.
No que se refere à prova, o CDC traz a inversão do ônus da prova, porém a aplicação deste instituto nos casos de repetição de indébito não é pacífica, uma vez que incumbir ao credor o ônus de provar pode obrigá-lo a produzir prova negativa ou impossível, pois terá que demonstrar a ausência de má-fé.
Quanto ao prazo prescricional, o CDC não prevê isso explicitamente para a repetição de indébitos, mesmo seu artigo 27 dispondo que prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço, pois não se pode afirmar que a cobrança indevida é um dano direto do produto ou do serviço.
Diante disso, deveria se aplicar as normas de prescrição do Código Civil, mas apesar disso, o STJ compreende que este artigo 27 do CDC tem aplicação na repetição de indébitos.
O que é repetição de indébito no CTN?
A repetição de indébito no Direito Tributário trata-se da devolução de tributo cobrado indevidamente, previsto de modo geral nos artigos 165 a 169 do Código Tributário Nacional.
Em outras palavras, o contribuinte terá direito à restituição de qualquer tributo nos casos em que houver cobrança ou pagamento de valor errôneo ou maior que o devido, erro de cálculo ou de alíquota, revogação, reforma, anulação ou rescisão de decisão condenatória. Confira essas hipóteses dispostas abaixo no artigo 165 do CTN!
Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:
I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;
II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
É válido ressaltar que, nessas situações, a restituição do valor total ou parcial faz com que sejam devolvidos os juros e demais sanções pecuniárias pagas de modo eventual, conforme disposto no artigo 167 do CTN, veja!
Art. 167. A restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa da restituição.
Parágrafo único. A restituição vence juros não capitalizáveis, a partir do trânsito em julgado da decisão definitiva que a determinar.
Os valores podem ser restituídos por devolução ou compensação, possibilitando que o contribuinte utilize o crédito para abater em débitos da mesma natureza ou recolhimentos futuros.
Ademais, a extinção do direito de pleitear a restituição ocorre no prazo de 5 anos, contados das seguintes hipóteses:
- Da data da extinção do crédito tributário;
- Da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.
Enfim, é necessário dizer que o indébito tributário é muitas vezes mensurado no âmbito administrativo, devido ao fato de facilitar a restituição, posto que o contribuinte pode demandar a autoridade fiscal que cometeu o equívoco de modo direto. Prescrevendo em dois anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.
A empresa que fez a cobrança errada é sempre obrigada a devolver em dobro?
Quanto a essa questão da empresa efetuar, sem o intuito, uma cobrança, o CDC traz um posicionamento abordando isso como exceção, trazendo o fato da cobrança indevida advir de um erro que seria justificável.
Diante desta situação, a empresa deverá proceder com a devolução apenas do que foi pago em excesso pelo consumidor.
A quesito de curiosidade, antes de 2020, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) trazia o entendimento de que em alguns casos o consumidor só tinha direito à restituição em dobro se fosse comprovada a má fé da entidade empresarial que efetuou a cobrança.
Entretanto, posteriormente, a Corte decidiu que a devolução em dobro do valor cobrado indevidamente do consumidor será cabível sempre que houver quebra da boa-fé objetiva, assim, não dependendo em nenhuma hipótese da comprovação de má-fé ou culpa.
O que é uma ação de repetição de indébito?
Como já abordado, o nome da ação judicial para solicitar a restituição denomina-se ação de repetição de indébito e para o seu ajuizamento, existem três requisitos essenciais, são eles:
- Natureza de pagamento ao ato;
- Inexistência de dívida entre as partes;
- Existência de uma prestação indevida;
Ainda vale ressaltar que, existindo uma dívida entre as partes e havendo o pagamento da mesma, ocorre a compensação desta dívida e, assim, não enseja qualquer repetição de indébito, seja simples ou em dobro, se aplicando isso também às dívidas que não podem ser cobradas dentro do ordenamento jurídico, como dívidas de jogos.
A doutrina não pacificou o entendimento sobre o que ocasiona o direito de ação de repetição de indébito, uma vez que parte dela defende que o pagamento efetivo é o ato gerador de direito e, outra parte, defende que o direito é gerado no momento da cobrança indevida.
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