usucapião extraordinária
Direito

Usucapião extraordinária: o que é, requisitos e prazos

Usucapião extraordinária: o que é, requisitos e prazos

A usucapião é um instituto fundamental do direito civil brasileiro, sendo a forma originária de aquisição da propriedade pelo uso (usucapio). Este mecanismo legal reconhece a prevalência da posse adequada e prolongada em detrimento da propriedade sem utilidade social, alinhando-se diretamente ao princípio constitucional da função social da propriedade. 

O objetivo primordial é conferir segurança jurídica ao possuidor e regularizar situações de fato consolidadas pelo tempo. Embora existam várias modalidades, a usucapião extraordinária é a mais tradicional e acessível, por exigir menos requisitos subjetivos do possuidor.

O que é usucapião extraordinária?

A usucapião extraordinária é a modalidade de aquisição da propriedade regulamentada principalmente pelo artigo 1.238 do Código Civil. Ela permite que um indivíduo se torne o dono de um imóvel após ocupá-lo por um longo período de tempo, desde que essa posse seja contínua, pacífica e sem oposição legal. 

A característica mais notável e definidora desta modalidade é que ela não exige prova de justo título nem boa-fé por parte do possuidor, sendo um instrumento ideal para regularizar posses que se iniciaram de maneira totalmente informal, sem qualquer documento que as justificasse ou mesmo com vícios. 

Para que a usucapião extraordinária seja concretizada, basta a comprovação da posse qualificada, exercida com o ânimo de dono (animus domini), de forma ininterrupta e incontestada, pelo prazo legal estabelecido.

Uma vez reconhecido o direito, seja em processo judicial ou extrajudicial, a aquisição da propriedade é originária, ou seja, ela é livre de quaisquer ônus e vícios anteriores, sendo o imóvel registrado em nome do possuidor, garantindo-lhe a plena segurança jurídica.

O que é a ação de usucapião extraordinária qualificada?

A usucapião extraordinária qualificada é uma variação da modalidade tradicional que prevê a redução do prazo de posse. Enquanto o prazo geral e máximo para a usucapião extraordinária é de 15 anos, este lapso temporal pode ser significativamente reduzido para 10 anos. 

Essa redução é um benefício legal, que visa incentivar e premiar o uso efetivo da propriedade, estimulando a sua função social. Para que a posse seja considerada qualificada com privilégio e gere essa redução, o possuidor deve comprovar o preenchimento de uma das duas seguintes condições de destinação social do imóvel: ter estabelecido no imóvel a sua moradia habitual ou ter realizado obras ou serviços de caráter produtivo no local

Assim, a lei reconhece o mérito do possuidor que, além de ter a posse mansa e pacífica, injeta utilidade social ou produtiva no bem.

O que é a ação de usucapião extraordinário extrajudicial?

A usucapião extraordinária extrajudicial representa um importante avanço processual, sendo um procedimento administrativo que permite a aquisição da propriedade diretamente no Cartório de Registro de Imóveis, eliminando a necessidade de um longo e custoso processo judicial. 

Trata-se de uma alternativa mais célere e menos onerosa para a regularização da posse, mas exige, como requisito fundamental, que o caso não envolva litígios ou objeções. Para que a usucapião extrajudicial seja viável, é essencial o consenso entre todas as partes interessadas, incluindo os vizinhos (confrontantes) e o antigo proprietário registral (se identificado), que devem assinar a anuência. 

A assistência jurídica de um advogado é obrigatória durante todo o trâmite, que envolve a reunião de documentos, a elaboração de planta e memorial descritivo por profissional habilitado, e a lavratura de uma ata notarial por tabelião, que atesta as condições da posse.

Qual a diferença entre a usucapião ordinária e extraordinária?

A diferença fundamental entre a usucapião extraordinária e a usucapião ordinária reside nos requisitos subjetivos exigidos do possuidor e no prazo de posse. 

A usucapião extraordinária é a modalidade mais flexível, pois não exige justo título nem boa-fé por parte do possuidor, focando-se apenas no longo período de posse mansa e pacífica, com prazo geral de 15 anos. É, portanto, aplicável em casos de posse irregular ou ocupação prolongada sem qualquer documentação formal. 

Por outro lado, a usucapião ordinária é mais rigorosa nos aspectos subjetivos, exigindo a comprovação de justo título (um documento que, embora não transfira a propriedade, faria o possuidor crer que é o proprietário) e a boa-fé (a crença legítima de que tem direito ao imóvel). Em compensação, por exigir esses requisitos subjetivos, o seu prazo de posse é menor, de 10 anos (podendo ser reduzido para 5 anos em casos de aquisição onerosa e moradia ou investimento).

Quais os requisitos principais do usucapião extraordinária?

Para que a usucapião extraordinária seja reconhecida, o possuidor deve preencher cumulativamente diversos requisitos legais, como a posse contínua e ininterrupta do imóvel, a posse mansa e pacífica, também deve agir com intenção de dono e tudo isso deve acontecer durante, no mínimo, 15 anos corridos ou 10 anos qualificados. A seguir, detalharemos cada um desses requisitos.

  • Posse contínua e ininterrupta: a posse não pode ser interrompida pelo prazo mínimo legal (15 ou 10 anos). Qualquer interrupção zera a contagem. A lei permite que o tempo de posse de antecessores seja somado (acessio possessionis).
  • Posse mansa e pacífica: a posse deve ser tranquila e incontestada, sem disputas ou oposições judiciais. Uma contestação na justiça quebra a pacificidade. Entretanto, a simples notificação extrajudicial ou boletim de ocorrência, por si só, não são o suficiente para quebrar o caráter pacífico.
  • Posse com intenção de dono: é preciso demonstrar que o ocupante agiu com a vontade clara de ser o proprietário, durante todo o período (animus domini). Isso é provado por atos de domínio, como pagar impostos, fazer benfeitorias e defender o imóvel. A posse não pode ser decorrente de mera permissão, comodato ou locação, pois nesses casos o animus domini não existe.
  • Prazo mínimo de 15 anos (ou 10 anos qualificados): O Código Civil exige um prazo mínimo de 15 anos. No entanto, este prazo é reduzido para 10 anos se o possuidor provar que estabeleceu ali sua moradia habitual ou realizou obras/serviços produtivos no imóvel.

Quanto tempo de posse para usucapião extraordinária?

O tempo de posse necessário para a usucapião extraordinária é, como regra geral, de quinze anos, sendo o prazo mais longo na legislação atual. Contudo, este prazo de 15 anos pode ser reduzido para dez anos se o possuidor tiver dado uma destinação social ao imóvel, comprovando que estabeleceu sua moradia habitual no imóvel ou realizou obras ou serviços de caráter produtivo no local. 

É de suma importância ressaltar que a legislação civil permite a soma das posses (acessio possessionis). Isso significa que a posse dos antecessores pode ser somada à posse dos sucessores para fins de preenchimento do requisito temporal da prescrição aquisitiva.

Qual é o prazo para a usucapião ser reconhecida no curso do processo judicial?

É plenamente possível o reconhecimento da usucapião de um bem imóvel mesmo que o requisito do prazo legal (os 10 ou 15 anos) só seja alcançado durante a tramitação do processo judicial. O Superior Tribunal de Justiça firmou um entendimento muito importante sobre este tema, facilitando a vida do possuidor.

Segundo a Corte, o magistrado deve, obrigatoriamente, considerar qualquer fato constitutivo ou extintivo de direito ocorrido após o ajuizamento da ação. Na prática, isso permite que o prazo de posse necessário para a usucapião seja contado até o momento da sentença final, e não apenas até a data em que o pedido foi protocolado na Justiça.

Ademais, a contestação apresentada pelo réu no curso da ação judicial não é capaz de interromper o transcurso desse prazo. A peça defensiva, nesse contexto, é vista como uma mera oposição formal à pretensão do autor (a usucapião) e não uma resistência efetiva à posse em si. Por essa razão, a contestação não quebra o lapso temporal necessário para a prescrição aquisitiva ser reconhecida pelo juiz.

Qual é o limite de área para usucapião extraordinário?

A usucapião extraordinária possui uma característica única no que tange à dimensão do imóvel: ela não estabelece um limite máximo de área para o bem a ser usucapido. Diferentemente de outras modalidades, como a Usucapião Especial Urbana, limitada a 250m², ou a Usucapião Especial Rural, limitada a 50 hectares, a modalidade extraordinária foca primariamente no longo período de posse mansa e pacífica, independentemente da sua dimensão. 

Isso significa que, se preenchidos os requisitos de tempo (animus domini e pacificidade), é teoricamente possível usucapir uma área de grande extensão, desde que o possuidor demonstre o exercício da posse qualificada sobre a totalidade do bem.

Cabe usucapião extraordinária em área inferior ao módulo urbano?

Sim, cabe usucapião extraordinária em área inferior ao módulo estabelecido em lei municipal, e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já pacificou o entendimento a respeito deste tema sob o rito de recursos repetitivos. O fundamento para este entendimento é que a lei federal que trata da usucapião extraordinária não definiu parâmetros territoriais mínimos para a usucapião de área urbana, limitando-se a definir limites máximos apenas para as usucapiões especiais. 

O reconhecimento da usucapião extraordinária, desde que preenchidos seus requisitos específicos, não pode ser obstado devido à área ser inferior ao módulo urbano definido localmente. A usucapião tem como principal objetivo a regularização da posse e o cumprimento da função social da propriedade, o que não se confunde com as normas de parcelamento do solo e edificação, que são providências administrativas relativas à função social da cidade e devem ser tratadas em momento posterior.

A aquisição de metade do imóvel impede usucapião especial urbana?

Não, a aquisição da metade ideal do imóvel não impede o reconhecimento da usucapião especial urbana. A Usucapião Especial Urbana exige que o pretendente “não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”, buscando beneficiar quem realmente não tem moradia. No entanto, o STJ fixou que ser proprietário da metade ideal do imóvel que se pretende usucapir não atrai a vedação legal do Artigo 1.240 do Código Civil. 

A jurisprudência admite a usucapião de bem em condomínio, desde que o condômino exerça a posse com exclusividade sobre o imóvel, aliada a atos de domínio, como o pagamento de tributos e a realização de benfeitorias. Nesse cenário, o possuidor da metade ideal, na prática, não possui uma moradia própria integralmente assegurada, e o reconhecimento da usucapião visa consolidar a situação fática da posse exclusiva em seu favor.

A ação de usucapião é viável se a enfiteuse não for registrada?

Sim, a ação de usucapião de imóvel urbano é viável na hipótese em que a enfiteuse (o contrato que a convenciona) não tenha sido levada a registro imobiliário, mesmo que tenha havido pagamento de foro por anos. A jurisprudência do STJ é categórica ao fundamentar que, no direito brasileiro, o registro imobiliário possui efeito constitutivo em relação a direitos reais sobre imóveis. Inexistindo o registro, o direito real de enfiteuse não se configura.

Portanto, a mera convenção entre as partes (proprietário e foreiro) não é suficiente para a constituição da enfiteuse. Na ausência dessa relação jurídica de direito real efetivamente constituída, não há impedimento para a aquisição originária da propriedade pelo possuidor através da usucapião, mesmo que ele tenha se comportado como enfiteuta por um período.

Quando o usucapião pode ser extrajudicial?

O usucapião pode ser processado na via extrajudicial (em cartório), conforme previsto na Lei de Registros Públicos, quando o caso não envolver litígios e estiverem presentes os requisitos essenciais. 

Os principais fatores que permitem a via extrajudicial são a ausência de oposição ou litígio, o consenso entre todas as partes interessadas (incluindo os vizinhos confrontantes e o proprietário registral), a representação obrigatória por advogado, e a apresentação de documentação completa e correta, que deve incluir a ata notarial lavrada por tabelião. 

A via extrajudicial é a opção mais eficiente para casos em que o único obstáculo para a regularização é a formalização da propriedade, e todos os envolvidos cooperam com o processo, pois qualquer contestação ou dúvida pode resultar no encerramento da via administrativa e na remessa do caso para o Judiciário.

A ação de usucapião independe de prévio pedido na via extrajudicial?

Sim, a ação de usucapião na via judicial independe de um prévio pedido ou da negativa do pedido na via extrajudicial. O ajuizamento da ação judicial é uma faculdade do interessado, ou seja, o interessado tem a liberdade de optar por qualquer um dos caminhos. O artigo que disciplina o procedimento extrajudicial estabelece claramente que este deve ocorrer “sem prejuízo da via jurisdicional”. 

Portanto, o interessado pode ajuizar a ação perante o juiz competente imediatamente, sem estar condicionado a uma negativa anterior do pedido em cartório. A via judicial é o caminho mais comum e seguro para casos onde há dúvidas na documentação, documentos incompletos ou um potencial de contestação por parte dos vizinhos ou do proprietário registral.

Conclusão

A Usucapião Extraordinária é um pilar do Direito Imobiliário. Sua força reside na acessibilidade, pois exige apenas o exercício prolongado e pacífico da posse, sem precisar provar boa-fé ou justo título. 

Ela honra a função social da propriedade: a posse efetiva transforma-se em propriedade legal, corrigindo a inércia do antigo dono em favor de quem cuidou e deu utilidade ao imóvel. Dominar suas nuances é crucial para a segurança jurídica e a satisfação do cliente na regularização fundiária.

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Autor
Foto - Eduardo Koetz
Eduardo Koetz

Eduardo Koetz é advogado, escritor, sócio e fundador da Koetz Advocacia e CEO da empresa de software jurídico Advbox.

Possui bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Possui tanto registros na Ordem dos Advogados do Brasil - OAB (OAB/SC 42.934, OAB/RS 73.409, OAB/PR 72.951, OAB/SP 435.266, OAB/MG 204.531, OAB/MG 204.531), como na Ordem dos Advogados de Portugal - OA ( OA/Portugal 69.512L).
É pós-graduado em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2011- 2012) e em Direito Tributário pela Escola Superior da Magistratura Federal ESMAFE (2013 - 2014).

Atua como um dos principais gestores da Koetz Advocacia realizando a supervisão e liderança em todos os setores do escritório. Em 2021, Eduardo publicou o livro intitulado: Otimizado - O escritório como empresa escalável pela editora Viseu.

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