Tecnologia, direitos trabalhistas e a uberização
A tecnologia não é responsável pelo fim dos direitos trabalhistas e a precarização do trabalho gerada pela uberização, e sim a política.
Relacionar o desenvolvimento tecnológico a formas pioradas de organização do trabalho é um erro. A tecnologia se desenvolve com o objetivo de melhorar a condição das pessoas, consumidores e trabalhadores.
Entretanto, o capitalismo aproveita momentos de transição tecnológica para aumentar o lucro e acumular dinheiro e capitais, através da retirada de direitos.
É o mesmo que está acontecendo com o Home Office, sendo que ainda não se consolidaram metodologias de controle de produtividade remota e as horas extras foram suprimidas.
Desmaterialização e sociedade do uso
O pensamento mais progressista sempre criticou muito a organização da sociedade focada na propriedade privada e a exclusão social que esta forma de organização social gera.
Mais recentemente se uniu a esta crítica o aumento da degradação ambiental gerada pela propriedade de automóveis e outros bens de consumo.
Nesse sentido, a desmaterialização dos bens e do consumo é aprovável e benéfico em inúmeros sentidos para o conjunto da sociedade e também para os trabalhadores.
A geração Z, nascidos após 1997, nativos digitais plenos, deixaram na sua imensa maioria de desejar ter um carro. A queda na compra de automóveis nessa faixa etária já colocou a indústria automobilística em crise e toda ela já está mudando.
O UBER e outros aplicativos de mobilidade são muito bem vindos por incentivarem a migração da sociedade da propriedade privada para a sociedade do uso.
Uberização e direitos trabalhistas
Na relação cliente x empresa, as relações comerciais estabelecidas pelo UBER com os seus clientes são nitidamente claras para o Poder Judiciário, que assume integralmente a relação comercial existente.
O cliente contrata o UBER, e problemas de prestação do serviço são responsabilidade da empresa, e não do motorista. Isso acontece em relação a todos os aplicativos de serviços.
Neste campo houve e ainda está havendo um crescimento importante no mercado jurídico, campo de atuação para a advocacia.
Mas a uberização de forma estranha criou um entendimento diverso no campo trabalhista.
Ainda para a Justiça do Trabalho esta questão é polêmica, e a maioria dos tribunais regionais do trabalho não reconhece a existência de vínculo empregatício entre o motorista e a empresa de aplicativo.
O mesmo ocorre em inúmeras empresas que precarizam o trabalho e criam um sistema de super exploração. Estudiosos da área estão denonimando os trabalhadores de aplicativos como “escravos urbanos”, mas o Poder Judiciário Trabalhista não reconhece o vinculo.
Assim, os aplicativos de mobilidade abusam do seu poder de comando e decisão, prejudicando os motoristas e criando uma situção de completa instabilidade profissional.
Um exemplo simples é a taxa de corrida para pelos motoristas, que fica variando entre 25% e 40% do valor cobrado do cliente.
O custo do aplicativo em relação à corrida varia entre 3 e 5% do custo total, sendo que o motorista assume mais de 90% do custo do serviço e da manutenção do veículo.
É verdade que os custos de marketing e publicidade são altos, mas a situação é nitidamente desequilibrada em favor dos aplicativos.
A uberização para se proteger e precaver de ações trabalhistas e de responsabilidade tributária frente a Previdência Social está exigindo a apresentação do MEI para efetuar a contratação dos seus motoristas.
Segundo o sociólogo do trabalho Ricardo Antunes “a expansão do trabalho uberizado nos levará a escravidão digital”.
Apesar do TST ter julgado pontualmente que não há relação de emprego entre o UBER e o motorista, a decisão ainda não está pacificada.
Para os advogados que atuam na área trabalhista a decisão sobre uberização é altamente relevante, pois irá basilar o futuro do direito do trabalho.
Se o Judiciário optar pela inexistência de relação de emprego isso poderá comprometer a própria existência do Direito do Trabalho separado do Direito Civil contratual na próxima década.
A juíza do trabalho do TRT da 4ª Região, Valdete Severo, defende abertamente que a relação entre motorista e a empresa de aplicativo é uma relação de trabalho, como no vídeo a seguir.
Generalização ou análise caso a caso?
Praticamente todos os setores da economia estão adotando aplicativos para a organização do trabalho, seja como plataforma de conexão prestador x consumidor, marketplace, saas ou inúmeros outros modelos de negócio.
O Cooperativismo de Plataforma por exemplo, defende a administração da organização do serviço pelos próprios trabalhadores, mas também através de aplicativos e também seguindo os padrões de preço do mercado.
Assim, adotar uma posição uniformizada sobre a diversas realidades de relação de trabalho é altamente temerário.
Haverá relações de trabalho excessivo, subordinado e precário para ser apreciado pelo judiciário, e haverá também relações de trabalho autônomas, independentes, respeitando os direitos constitucionais dos artigos 6º e 7º e benéficos aos trabalhadores.
O Aplicativo da RedeCoop de pequenos agricultores conecta-os com os consumidores para venda de produtos, a partir de uma taxa básica mensal.
No mercado jurídico, a contratação de correspondentes que chegam a obter renda acima de 15 mil reais mensais trabalhando de forma independente e pagando a taxa para o aplicativo é outro exemplo.
Há portanto um impedimento real de adoção a uma posição generalizada em relação a adoção de aplicativos, mas uma opinião majoritária de que os trabalhadores (empregados ou não) não podem viver expostos ao perigo de vida e à precariedade de renda.
Uberização da Advocacia
“Nunca existiram advogados tão ricos como na atualidade, e nunca existiram advogados tão pobres”.
Essa frase está no primeiro capítulo do livro OTIMIZADO, o escritório como empresa escalável, que retrata o processo de prestação do serviço jurídico e no que o capitalismo transformou o mercado de advocacia.
Esta separação de classe social da população de advogados reestruturou as relações profissionais, especialmente na área de contencioso de massa e de escritórios corporativos.
A terceirização se disseminou na contratação de advogados correspondentes em todo Brasil, e essa categoria amplia o mercado e avilta honorários, incluindo profissionais sem habilitação na OAB.
Grandes escritórios pressionam para pagar por menores honorários pelos bacharéis e estudantes que ainda não tem carteira da OAB, e pressionam os que tem carteira da OAB para reduzir honorários porque os não habilitados cobram menos.
Há uma precarização do trabalho intensa na advocacia.
A fim de proteger os grandes escritórios corporativos de ações trabalhistas e tributárias, que contratam correspondentes em massa, a OAB e o governo criaram a figura da Sociedade Unipessoal de Advocacia.
A sociedade individual de advocacia é o correspondente ao MEI para o setor.
Assim, a uberização está presente na advocacia e protegida por lei, sem deixar margem para reconhecimento de vínculo algum.
Aviltamento de honorários
A Uberização atinge todos os advogados de cada área do Direito, e não apenas aqueles precarizados.
Em qualquer mercado, inclusive o mercado jurídico, quando o serviço é oferecido por preços menores, a demanda tende a migrar para o mais barato.
Assim, em médio e longo prazo todos os advogados e escritórios são atingidos, inclusive os advogados que viabilizaram a contratação precária (o feitiço vira contra o feiticeiro).
Há uma desvalorização completa e integral da profissão.
Escritório Digital como alternativa a Uberização na advocacia
Há uma movimentação imensa de advogados em direção a advocacia do autor, em defesa da população.
Não apenas os jovens advogados, mas também os advogados sêniores estão percebendo que se organizar sozinho e prospectar clientes ficou muito mais barato e democrático com as redes sociais.
O posicionamento especializado e correto permite a contratação direta, sem intermédio de uma grande banca, para atuação em processos complexos com altos honorários, mantendo uma estrutura de custos mínima com o Escritório Digital.
Consultores especializados como Fernando Ricciardi e Euro Júnior estão formando uma classe de advogados com alta maturidade digital.
E a reunião de profissionais através de plataformas de trabalho coletivo e remoto, como a ADVBOX, tem potencializado ainda mais o poder da advocacia digital como alternativa à uberização na advocacia.