Trabalho intermitente: quais são as regras dessa modalidade? Entenda!

Trabalho intermitente: quais são as regras dessa modalidade? Entenda!

O trabalho intermitente surgiu com a Reforma Trabalhista de 2017 e se tornou uma modalidade muito buscada por empregadores em todo o Brasil. Embora já existisse, a legislação passou a regulamentá-la, criando regras específicas tanto para o empregador quanto para o trabalhador.

As leis trabalhistas se modificaram consideravelmente ao longo dos anos. Diversas mudanças, principalmente as que ocorreram em 2017, são questionadas por especialistas. O trabalho intermitente é uma delas.

Nesse artigo, você entenderá tudo sobre essa modalidade de trabalho, qual o funcionamento dela e o que a lei demanda. Acompanhe a leitura e entenda mais!

O que é trabalho intermitente?

O trabalho intermitente, também conhecido como esporádico, é aquele que possibilita que uma empresa contrate um funcionário para realizar trabalhos eventuais, remunerando-o apenas pelo período em que laborou.

As Consolidações das Leis Trabalhistas (CLT) dispõe sobre essa modalidade no artigo 443, em seu §3º. Confira a letra da lei:

Art. 443.  O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente. 

(…)

§ 3o  Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.  

Nesse sentido, o colaborador que se enquadra nesse modelo realiza o seu trabalho de maneira esporádica, intercalando períodos de atividade com momentos de inatividade.

O que é o contrato de trabalho intermitente?

O trabalho esporádico sempre existiu na sociedade brasileira. A Reforma Trabalhista resolveu formalizá-lo, buscando garantir direitos trabalhistas às pessoas que laboram nesse modelo. 

Dessa forma, o trabalhador intermitente passou a ter direitos e benefícios que os demais trabalhadores previstos na CLT possuem.

Isso significa que o trabalho intermitente exige a formalização de um contrato para regularizar a prestação de serviços não contínua. Nele, deve constar os períodos de atividade e os de inatividade, subordinação e os direitos trabalhistas previstos para essa modalidade. 

O que antes era conhecido apenas como “bico”, passou a ser regulamentado por meio da lei, evitando-se, assim, a informalidade.

Como funciona esse contrato?

O contrato de trabalho intermitente precisa ser elaborado por escrito e especificar o valor da hora de trabalho. Importante ter em mente que o preço da hora não pode ser inferior ao valor da hora do salário mínimo ou aquele devido aos demais colaboradores da empresa que exercem a mesma função, sejam eles empregados ou intermitentes. 

Conforme as leis trabalhistas, o período de inatividade não pode ser considerado como tempo à disposição do empregador. Ou seja, quando não estiver trabalhando, o colaborador estará livre, não de pronto-aviso. Tanto que ele não será remunerado por esse período de inatividade. Dessa forma, o intermitente pode também prestar serviços para outros empregadores. 

Conforme o artigo 452-A da CLT, o empregador deve convocar o trabalhador intermitente com 3 dias corridos de antecedência para realizar o serviço, avisando-o como será a sua jornada de trabalho.

Ademais, o empregado deve dar a sua resposta se deseja realizar o trabalho com até 1 dia útil de antecedência. Caso não o faça, será considerado que negou o serviço. 

Caso alguma das partes descumpra o acordo sem justificativa justa, deverá pagar a outra parte, em até 30 dias, multa de 50% da remuneração devida, permitindo que seja feita a compensação em igual período.

Trabalho intermitente: quais são as regras dessa modalidade? Entenda!
Trabalho intermitente: quais são as regras dessa modalidade? Entenda!

Quais são as características dessa modalidade?

Essa modalidade de trabalho tem suas particularidades, se diferenciando muito do modelo tradicional de contrato de trabalho. Conforme a legislação, as principais características do trabalho intermitente são:

  • Possui registro na carteira de trabalho;
  • O trabalhador tem períodos de inatividade;
  • Possibilidade de prestar serviços para mais de um empregador;
  • Convocação deve ser feita com pelo menos 72 horas de antecedência;
  • Aceitação do trabalho deve ser feita com pelo menos 24 horas de antecedência;
  • O pagamento deve ser imediato, logo ao fim de cada período de atividade;
  • O trabalhador não é obrigado a aceitar as convocações;
  • Direitos como: férias, décimo-terceiro salário e descanso semanal remunerado;
  • Deve haver o pagamento de multa por desistência depois da confirmação.

Ou seja, o contrato de trabalho intermitente prevê diversos direitos e regras que precisam ser observadas para a relação de trabalho ser configurada dessa forma, evitando que direitos trabalhistas sejam lesados.

Como funciona a carga horária nessa modalidade?

Uma das maiores dúvidas em relação ao trabalho intermitente é sobre a carga horária permitida para essa modalidade.

De modo geral, muitos podem acreditar que não existe uma carga horária específica. Contudo, existe previsão em lei que determina que ela seja igual ao do regime convencional. Ou seja, deve-se observar o limite de até 44 horas semanais e 220 horas mensais. 

Ocorre que, como existem períodos de inatividade, essas horas não são realizadas para um único empregador. Até porque, se isso ocorrer, o contrato de trabalho não será intermitente, mais sim de uma relação de emprego tradicional.

Por fim, é importante observar que não existe previsão sobre carga horária mínima, devendo apenas observar o limite máximo. 

Quais são as vantagens do trabalho intermitente?

O contrato de trabalho intermitente tem algumas vantagens. Confira algumas delas abaixo!

Formalidade

O trabalho intermitente exige a elaboração de um contrato para formalizar a relação entre empregado e empregador. Antes da lei regularizar essa modalidade, era comum muitas pessoas que laboravam dessa forma não ter segurança e direitos nenhum, recebendo apenas pelo que trabalhou no dia e ficando a mercê da boa-fé do empregador.

Por isso, é fato que o contrato concede mais segurança, tanto para o trabalhador, que terá seus direitos assegurados, quanto para o empregador, que pode evitar prejuízos pelo não comparecimento do contratado, por exemplo.

Possibilidade de vários contratos

Outra vantagem dessa modalidade é a possibilidade de formalizar diversos contratos de trabalho. Dessa maneira, o trabalhador pode aumentar a sua renda e terá os seus direitos resguardados em cada uma das relações de trabalho.

Ademais, o trabalhador intermitente não precisa apenas elaborar contratos nessa modalidade. Ele pode também celebrar outros acordos, como contrato de trabalho tradicional, trabalho autônomo e até atuar como freelancer, se desejar. 

Flexibilidade

A flexibilidade é outra vantagem dessa modalidade. Enquanto que em uma relação de emprego tradicional o trabalhador deve se sujeitar às 44 horas semanais, o trabalhador intermitente consegue trabalhar em horários diferenciados, possuindo tempo livre para trabalhar em outras empresas ou descansar.

Diversas experiências

Atualmente, as pessoas costumam trabalhar em diversas empresas ao longo dos anos. Isso significa que as novas gerações já não permanecem em um mesmo emprego por toda a vida, como as gerações anteriores faziam.

Essa mobilidade pode ser desafiadora e positiva para muitas pessoas, principalmente para aquelas que gostam de ter novos desafios de forma constante.

Quais são as desvantagens do trabalho intermitente?

Por outro lado, existem certas desvantagens do contrato de trabalho intermitente. Veja abaixo algumas considerações.

Incompatibilidade de horários 

O fato de poder prestar serviços para mais de um empregador pode fazer com que, quando o trabalhador for convocado por um, pode não estar disponível por já ter aceito o trabalho oferecido pelo outro.

Felizmente, mesmo tendo o vínculo formalizado pelo contrato, o trabalhador pode recusar a proposta, sem que isso se configure insubordinação. 

No entanto, na prática, se a pessoa formalizou contrato com 2 restaurantes que trabalham de noite, por exemplo, essa incompatibilidade pode ocorrer, o que prejudica as chances de obter uma remuneração maior ao final do mês.

Remuneração

A remuneração de um trabalhador intermitente pode ser baixa, mesmo prestando serviços para mais de uma empresa. Na prática, isso não é incomum, pois é possível encontrar pessoas que trabalham nessa modalidade e auferem menos de 1 salário mínimo por mês. Isso faz com que muitos ainda prefiram trabalhar do modo tradicional.

Não recebimento pelo período de inatividade

Para os profissionais, o fato de não receber pelo período de inatividade é um ponto negativo. De fato, se recebessem por isso, a remuneração auferida poderia ser maior.

Quais são os direitos do trabalhador intermitente?

O contrato de trabalho intermitente faz com que o trabalhador se torne parte do quadro de funcionários da empresa. Sendo assim, ele possui diversos direitos trabalhistas, sendo os mesmos dos demais, ainda que proporcionais ao período trabalhado. 

Veja abaixo os direitos do trabalhador intermitente!

Registro na carteira de trabalho

Conforme mencionado anteriormente, o contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e o trabalhador tem o direito de ter esse registro em sua carteira de trabalho. 

Salário

O valor acordado de salário não pode ser inferior ao valor diário ou da hora do salário mínimo vigente na época da contratação. Ademais, esse trabalhador não pode receber menos que os demais funcionários da empresa que exercem a mesma função.

Esse pagamento deve ser realizado na sua totalidade, acrescido dos benefícios legais. O prazo é imediatamente após o término de cada período trabalhado ou no máximo em até 30 dias, contados do primeiro dia de trabalho. 

Férias 

O contrato de trabalho intermitente garante férias ao trabalhador. Nesse caso, ele tem direito a 30 dias de férias a cada 12 meses trabalhados na empresa, tempo esse que pode ser dividido em três períodos. 

É essencial ter em mente que, durante esse período, a empresa não pode convocar o trabalhador! Outro aspecto que deve ser observado é que as férias não são remuneradas, visto que os valores referentes à elas devem ser pagos proporcionalmente ao final de cada convocação. 

Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), deve ser recolhido pela empresa, da mesma forma que ocorre com os outros trabalhadores. O valor tem como base o montante pago no período de um mês. Uma vez feito o recolhimento, o empregador deve entregar o comprovante do pagamento ao empregado. 

Outros benefícios trabalhistas 

Existem outros direitos trabalhistas, como: décimo-terceiro salário, horas extras, comissões e repouso semanal remunerado, que devem ser pagos proporcionalmente e em conjunto com o salário acordado. 

É interessante que o trabalhador receba um detalhamento de tudo o que lhe foi pago, de modo a garantir clareza na relação de trabalho. 

Qual é o prazo do contrato de trabalho intermitente?

Conforme a legislação, não existe um período mínimo ou máximo a ser cumprido no contrato de trabalho intermitente. Nesse sentido, ele costuma ser feito por tempo indeterminado. 

Qual é a diferença entre o trabalho intermitente e o trabalho temporário?

Alguns empregadores e profissionais confundem o conceito do trabalho intermitente com o do trabalho temporário. Entretanto, é importante saber diferenciar, visto que são modalidades distintas.

A contratação esporádica é celebrada por meio de um acordo de tempo indeterminado. Por outro lado, o contrato temporário possui um tempo determinado, com um fim previsto.

Nesse sentido, no trabalho temporário, o documento de formalização prevê o tempo de vigência do contrato, determinando o período em que o profissional estará vinculado à empresa para desempenhar suas tarefas. 

O contrato intermitente, por sua vez, não possui um tempo de vigência definido. Nesse sentido, o colaborador se mantém contratado, mesmo nos períodos de inatividade. Dessa forma, ele pode ser convocado pelo empregador apenas nos momentos em que os seus serviços são necessários. 

O que deve ter no contrato de trabalho intermitente?

No momento de formular um contrato de trabalho intermitente, é essencial ter atenção de modo a não esquecer requisitos importantes. Veja abaixo as principais informações que devem estar no documento!

  • Identificação do empregador e do empregado;
  • Valor acordado de remuneração;
  • Forma como deve ser realizado o pagamento;
  • Prazo para o pagamento do salário e demais direitos trabalhistas;
  • Local onde o serviço será prestado;
  • Turno de trabalho (diurno ou noturno, por exemplo);
  • Como será feita a convocação, bem como os canais utilizados para isso;
  • Orientações em relação aos casos de desistência da convocação.

No momento de elaborar o contrato, é fundamental observar as regras dessa modalidade para evitar que os direitos trabalhistas do empregado sejam lesados. Dessa forma, qualquer regra que desconfigure o trabalho intermitente e torne-o um contrato de trabalho tradicional poderá resultar em reclamações no poder judiciário.  

Como é feita a rescisão contratual?

A rescisão do contrato de trabalho intermitente pode ocorrer de diversas maneiras. Ele pode terminar automaticamente caso o empregador não convoque o trabalhador por período superior a 1 ano. Além disso, qualquer uma das partes pode terminar a relação de emprego caso desejem.

As demissões por justa causa ou as rescisões indiretas também podem ocorrer nessa modalidade. 

O importante é entender que, caso o empregador decida demitir um trabalhador intermitente, ele deve pagar as seguintes verbas indenizatórias:

  • 50% do valor do aviso prévio;
  • 20% do valor do saldo do FGTS;
  • Todas as verbas trabalhistas devidas de forma integral.

Por fim, cumpre ressaltar que o saque do FGTS é limitado, podendo este sacar apenas 80% dos valores depositados pela empresa. Ademais, o trabalhador intermitente não tem direito ao seguro-desemprego. 

Quanto ganha um trabalhador intermitente?

Um trabalhador intermitente ganha conforme as horas ou dias trabalhados, não recebendo pelos períodos em que não laborou. A sua remuneração pode variar muito conforme o salário acordado, quantidade de horas ou dias trabalhados e quantidade de contratos fechados. 

Por esse motivo, a sua remuneração total pode ser menor que 1 salário mínimo ou até maior do que a média salarial do país para os empregos formais. 

Exemplos de trabalho intermitente

Existem diversos exemplos de trabalho intermitente que podem ser mencionados. O mais comum ocorre, por exemplo, com garçons e cozinheiros em restaurantes. 

Na prática, esses estabelecimentos podem precisar de mais trabalhadores em períodos determinados e em datas comemorativas. 

Para suprir essa demanda, os empregadores podem contratar esses profissionais por meio dessa modalidade, chamando-os nos momentos de maior movimento de consumidores.

Críticas ao trabalho intermitente

O trabalho intermitente foi criado para formalizar as relações de trabalho daqueles que vivam do famoso “bico”. Contudo, alguns profissionais argumentam que essa modalidade fez com que muitos empregadores passassem a evitar o contrato de trabalho formal. 

Dessa forma, em vez de contratar profissionais como empregados tradicionais, realizam contratos intermitentes a fim de eliminar despesas. 

Conforme especialistas, isso acabou prejudicando e precarizando muitos trabalhadores. Inclusive, é o que defendeu a juíza Noêmia Porto, em entrevista concedida à UOL:

Segmentos econômicos de caráter continuado estão fazendo uso da contratação intermitente para baratear a remuneração dos trabalhadores. A modalidade viola qualquer patamar de proteção.

Nesse aspecto, é preciso que os advogados trabalhem de modo a eliminar esses problemas, instruindo tanto a população quanto às empresas a trabalharem conforme a lei, evitando lesar direitos. 

O trabalho intermitente surgiu para suprir algumas demandas do mercado e formalizar uma relação de trabalho que já existia há muito tempo e era informal. No entanto, é essencial se atentar às regras existentes para evitar lesões aos direitos desses trabalhadores e injustiças.

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Autor
Foto - Eduardo Koetz
Eduardo Koetz

Eduardo Koetz é advogado, escritor, sócio e fundador da Koetz Advocacia e CEO da empresa de software jurídico Advbox.

Possui bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Possui tanto registros na Ordem dos Advogados do Brasil - OAB (OAB/SC 42.934, OAB/RS 73.409, OAB/PR 72.951, OAB/SP 435.266, OAB/MG 204.531, OAB/MG 204.531), como na Ordem dos Advogados de Portugal - OA ( OA/Portugal 69.512L).
É pós-graduado em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2011- 2012) e em Direito Tributário pela Escola Superior da Magistratura Federal ESMAFE (2013 - 2014).

Atua como um dos principais gestores da Koetz Advocacia realizando a supervisão e liderança em todos os setores do escritório. Em 2021, Eduardo publicou o livro intitulado: Otimizado - O escritório como empresa escalável pela editora Viseu.